Um texto clássico do cientista convertido a filósofo, Michael Polanyi, The Tacit Dimension, publicado orginalmente em 1966, é um marco para a conceituação do que vem a ser o conhecimento tácito (Polanyi, 1997). A importância deste tema na literatura organizacional, acreditamos, tem sido bem explorada, primeiramente por Mitzenberg (1989), com seus trabalhos sobre o papel desempenhado pela intuição no processo de tomada de decisão gerencial e, mais recentemente por Nonaka e Takeuchi (1995), em sua obra The Knowledge-Creating Company, na qual estes autores elaboram um modelo de criação de conhecimento baseado no círculo virtuoso da interação entre conhecimento tácito e explícito. Polanyi introduz o tema do conhecimento tácito a partir da frase we can know more than we can tell17. Com isto ele quer dizer que muito do que sabemos não pode ser verbalizado ou escrito através de palavras. Isto fica mais claro a partir dos exemplos cotidianos e científicos apresentados por ele. Como exemplos mais intuitivos ele cita:
- nossa capacidade de conseguirmos distinguir o rosto de uma pessoa conhecida entre tantas outras, mas não sermos capazes de explicitar os particulares que compõem o todo. Daí os artifícios usados pela polícia que, para fazer retratos falados, utiliza uma vasta coleção de fotos de partes específicas do rosto, como narizes, bocas e outros detalhes;
- o fato de pianistas virtuosos tenderem a ficar paralisados, quando fixam sua atenção ao movimento de seus dedos;
- a habilidade de pessoas cegas, que usam a bengala como uma extensão de seu corpo.
Além disso, vários estudos em laboratório mostram a nossa capacidade de reação intuitiva a estímulos externos não compreendidos pela nossa mente consciente. Neste sentido, Polanyi cita os exemplos de testes psicológicos envolvendo "shock syllables" e "shock words". Nestes testes, verificou-se que as pessoas eram capazes de antecipar choques elétricos ao verem palavras e sílabas que, de fato, como parte da lógica do experimento, estavam associadas a choques, mesmo sem serem capazes, a posteriori, de explicitar a lógica do experimento. Verificou-se, também, em laboratório, através de câmaras escondidas de alta resolução, que muitos dos movimentos dos músculos, ditos "involuntários", poderiam ser, na verdade, estimulados externamente, mesmo sem a consciência humana.
Para Polanyi, o conhecimento tácito envolve, pois, uma relação entre duas coisas: um conhecimento específico, como "tocar piano", utilizar uma ferramenta, etc, que ele chama de distal e um outro, que ele chama de proximal, do qual só temos consciência na medida em que ele serve ao anterior. Ele compara ainda seus conceitos de conhecimento tácito aos resultados da gestalt. Esta seria o resultado de um esforço ativo e laborioso de busca de conhecimento, que envolveria o nosso corpo e todos os seus sentidos. Neste aspecto, a aquisição de conhecimento, seja intelectual ou prático, seria resultado de envolvimento e compromisso pessoal.
O conceito de conhecimento tácito também ajudaria a explicar por que a compreensão de assuntos complexos pode ser prejudicada, quando se busca fazê-lo, primordialmente, a partir de sua decomposição em partes e análises estritamente racionais. Não que isto não deva ser feito para se obter um aprofundamento sobre o tema em questão. O importante é não perder o foco no todo e isto só ocorre, quando a realidade é interiorizada e todos os detalhes recuperam seu significado e complexos relacionamentos. Dessa maneira, Polanyi expressa total rejeição a qualquer noção de conhecimento absolutamente objetivo, inclusive nas ciências naturais, pois mesmo a formulação de teorias, neste campo, envolveria o conhecimento tácito.